A eternidade pesa? O tempo não tem concretude a não ser na nossa carne, em dor ou prazer, enquanto durem. Tais evidências são temporais e finitas. O sentido do eterno vai além do tempo. Este senso de infinitude será real? Ultrapassar os limites de um conceito, acessar esta parte volátil e sem bordas de uma ideia, destituída de nossas ferramentas sensoriais e seus processos químicos cerebrais, assusta. Somos empurrados por estas circunstâncias e mergulhamos no universo das suposições. Temos que tomar decisões e rumos um tanto a Deus dará, destituídos de qualquer Deus como referência em que nos apoiarmos. Bem-vindo ao mundo contemporâneo da solidão e responsabilidade total do sujeito pelas próprias escolhas, ainda que imerso e provindo de inúmeras subjetividades. Ou seja, moldamos nosso eu da massa múltipla de outros eus.
A existência precede a essência é o pedal acelerador da humanidade. Sartre inverte a ordem dos fatores até então, na transição do pensamento moderno para o contemporâneo. É o tempo da liberdade absoluta e absoluta solidão. Viver torna-se um peso, do qual não nos alivia nenhum Cirineu. Precisamos assumir consequências, absolutamente por conta própria de nossas escolhas, um tanto no escuro. Penso em constância como uma alternativa à eternidade. Embora pareçam sinônimos à primeira vista, constância abrange certa concretude, porque abarca nossos atos. Quanto à eternidade, ninguém vive o suficiente para usufrui-la. O que pesa não é a eternidade. Ela é só um conceito. O que pesa é nossa corrida de corpo e alma em busca de eternizarmo-nos, antes de morrer, em grandes feitos.
Nada do que fazemos parece suficiente, e os dogmas escolásticos nos estrangulam e nos condenam a vivermos mortos já, de antemão. Ainda que possamos pensar de início que constância significa amarrar-se a um propósito único, seu sentido mais profundo está ligado à atitude frente ao transformar-se contínuo das coisas. Eternidade estaria fora do nosso alcance, mas constância não. Porém existe outro elemento etéreo, vivível apenas através de nossos atos. O bem que praticamos. Este Bem é que pode e deve ser constante. Porque a constância é neutra, mas o tecido que lhe dá forma a vivifica.
Observando a criança, vemos espanto, admiração, curiosidade e prazer manifestos em sua inocência, diante do mundo. Esta é uma constância manifesta em tempo muito curto. Conforme vamos nos tornando adultos, o espanto vai se transformando em medo, a admiração em dúvida e o prazer em angústia. A inocência entra em colapso. Os mais conscientes lutam pela constância da espontaneidade da criança, depois de adultos. Isto talvez signifique deixar a vida fluir, não significando desimplicação ou indiferença. Deixar a vida fluir sintoniza mais com o deixar que as coisas sejam o que são. Envolvê-las nos nossos significados faz parte da condição humana, mas prender-se a elas não. Viver aprisionado à morte como perda, a uma ideologia, a um princípio ou a um pré-juízo nos tolhe o prazer de renovar constantemente nossa vida.
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